04 Curatorial - Chen Kong Fang

Apr 16, 2024 · 8m 51s
04 Curatorial - Chen Kong Fang
Description

CHEN KONG FANG - O REFÚGIO Chen Kong Fang chegou ao Brasil em 1951 com uma pintura na bagagem que guardaria consigo até o final de sua vida. Intitulada “O...

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CHEN KONG FANG - O REFÚGIO

Chen Kong Fang chegou ao Brasil em 1951 com uma pintura na bagagem que guardaria consigo até o final de sua vida. Intitulada “O refúgio” e datada de 1949, consiste em um retrato de seu pai e sua mãe em uma cena com certo teor dramático. A imagem mobiliza o tema do desterro, com lastro iconográfico significativo na pintura chinesa, marcada pelas guerras que assolaram o país no raiar do século XX. Seu pai, Han Cheng-Fong, envolvera-se com a Revolução de Xinhai, que destituiu a Dinastia Qing em 1911 para proclamar a República da China, e faleceu em 1943, próximo ao final do período da ocupação japonesa e antes da partida do filho para o continente sul-americano em decorrência da tomada do poder no país pelo Partido Comunista. Chen Kong Fang - O refúgio se debruça sobre a carreira e a obra desse artista que construiu sua morada no Brasil, desenvolvendo a sua prática pictórica no tecido artístico paulistano por cerca de cinco décadas. A exposição, primeira retrospectiva do artista em uma instituição brasileira, reúne um conjunto de mais de cem obras, entre pinturas a óleo e sumi-ê produzidas entre o final dos anos 1940 e o início da última década. Ao invés de um partido cronológico organizado em fases sucessivas, a mostra enfatiza como o artista, que concebia a pintura como um caminho, fez de seu labor uma lida constante com gêneros pictóricos consolidados. Tomando partido da reabertura experimental pelas vanguardas modernas, imprimiu sua dicção própria nas ideias de retrato, paisagem e natureza morta.Fang produziu um extenso corpo de trabalhos, que nunca deixou de incluir, ainda, o sumi-ê. Por meio da fricção com as convenções de enquadramento pictórico, suas obras reverberam imagens que articulam diferentes escalas do olhar, assim como visões que suspendem a verossimilhança das cenas, abrindo-se ao inesperado e ao inominável. O conjunto reunido nesta exposição evidencia o modo como seu interesse pela assimetria, o equilíbrio entre tensões conflitantes e a atmosfera combinou-se à construção de um vocabulário visual singular, capaz de assimilar contribuições de tradições estéticas múltiplas.

Paulo Miyada e Yudi Rafael

FEIÇÕES
Os raros retratos pintados por Fang podem ser vistos como casos em que ele aborda, por um lado, um campo familiar que inclui a si mesmo, seus familiares e conterrâneos e, por outro, registra o encontro com a alteridade ao emigrar para o Brasil. Em todos os casos, o artista se vê desafiado a conter sua abordagem expressiva e inconstante das massas de tinta e do desenho para acomodar a possibilidade do reconhecimento das feições que escolhe retratar. 

CASARIOS
Embora tenha chegado a São Paulo no começo da década de 1950, época de crescimento e modernização da cidade, Fang dedicou seu olhar para a paisagem urbana localizada nas margens e hiatos da pulsão industrial alardeada pela elite econômica. Casebres, barracos, ruas de terra e espaços vazios comparecem no casario que o artista descreve, seja em alinhavos esquemáticos de conjuntos, seja no recorte de construções específicas. Pelo avesso, essas também são cenas do projeto desenvolvimentista, visto em contraplano.

COISAS
O mais numeroso grupo de obras de Fang é composto de variações em torno do gênero da natureza morta. Seus arranjos de objetos sobre mesas são repletos de pontos de contato com a tradição da pintura moderna, com acenos para artistas tão diversos quanto Cézanne, Picasso e Morandi. Na dicção de Fang, as referências se recombinam em uma espacialidade planificada, com uma perspectiva tão achatada que os suportes horizontais quase coincidem com o plano vertical da tela. Dessa forma, os objetos representados perdem seu peso, existem como coisas com textura e cor em suspensão.

FISSURAS
É notável como diversos dos ambientes e espaços representados por Fang são pontuados por rasgos, janelas, cantos e aberturas que conectam o interior da arquitetura com a escala da paisagem de fora. Essas fissuras funcionam também como inserção de uma imagem dentro de outra, de modo que na obra desse artista quaisquer elementos em cena podem se tornar um potencial foco de atenção, independentemente de sua distância presumida. A força evocativa de algumas das paisagens entrevistas, além disso, suscita uma reorganização da hierarquia da cena, tornando o espaço interno uma espécie de plano de enquadramento da vista exterior.

ATMOSFERAS
Quando se lançava a pintar paisagens não urbanas, Fang se valia de grandes superfícies enfatizadas pela cor para indicar a vastidão e pujança de elementos naturais como a água e a terra. Ele também se utilizava de recursos de enquadramento e composição da tradição da pintura de paisagem chinesa para sugerir a relação complementar dinâmica desses elementos. Mais do que descrever lugares, propõe uma pintura que se volta para a sintetização de atmosferas, que se reflete na variação de formas e cores deste grupo de obras.

VISÕES
O caráter espontâneo e inconstante do desenho com que Fang delineava suas pinturas extrapolava ocasionalmente a deformação das figuras, chegando a colocar em suspensão a verossimilhança de suas imagens. Entram em cena, nessas visões, figuras fantasmagóricas ou oníricas, fantasias do pintar que acentuam o caráter evocativo já saliente nas suas obras. Embora menos recorrentes, essas são imagens reveladoras da liberdade com que Fang abordou a arte por toda a sua vida, de modo a manter os diálogos com convenções da pintura tradicional e moderna abertos para a aparição do inesperado e do inominável.

SUMI-Ê
Fang iniciou-se na prática do sumi-ê em sua terra natal e a manteve ao longo de toda sua vida, encontrando no Brasil uma receptividade para essa tradição de arte monocromática e caligráfica. Realizou demonstrações e exposições de sumi-ê em Salvador e São Paulo, publicou ilustrações em jornais e produziu cartões com imagens de animais do horóscopo chinês, que enviava para amigos e familiares em datas festivas. Cabe notar, ainda, que esse exercício contínuo ressoou em sua prática pictórica, na qual as variações sutis de sentido e velocidade do traço podiam se estender por meio de diferentes estágios de definição das imagens.
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Information
Author Instituto Tomie Ohtake
Organization Instituto Tomie Ohtake
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